PAIS, OS VERDADEIROS HERÓIS - P. G. S. ZAGO (TEXTO ORIGINAL)

Ser pai não é algo orgânico. Não se forma por instinto ou tendência natural como acontece com as mães. Durante nove meses o pai é mero coadjuvante de uma experiência da qual ele só participa como espectador. Seu corpo não muda, seu quadril não se alarga, suas costas não doem pelo peso adicional de um bebê crescendo dentro do útero, seus pés não incham e ele não sofre as alterações hormonais que mexem com as emoções e a razão.

Por nove meses o pai assiste às transformações que ligam a mãe ao filho(a) física e emocionalmente, apreciando pequenos contatos superficiais, acariciando a barriga e sentindo os movimentos e chutes, ligando-se emocionalmente à ideia do filho(a) que ele ainda não conhece, tudo de forma muito abstrata.

O pai não sofre as dores do parto e não é responsável por dar o filho(a) à luz. Ele apenas acompanha e apoia, e espera. O bebê nasce e é colocado imediatamente no colo da mãe, proporcionando a ele o conforto do contato com aquela com quem ele esteve intimamente ligado desde o início de sua existência. O pai se emociona, chora, observa e continua sua espera. O pai espera e enfim chega o seu momento.

O pai segue o filho(a) que é levado pela enfermeira para uma sessão tortuosa de pesagem, medidas, testes. E é neste momento que o pai finalmente alcança a conexão máxima e especial que tanto ansiava com esse pequeno ser que também é parte de si, quando estica o dedo e o filho(a) o agarra firme, encontrando conforto nesta nova ligação. Esse contato exprime segurança, e a partir deste momento é isso que o pai representa: Segurança.

O pai não pode amamentar, mas compensa com trocas de fralda, colos, embalos, ainda que saiba que nesta fase inicial a mãe seja o real recanto do filho(a), enquanto o pai é mero assistente. Mas cada vez que o filho(a) agarra o seu dedo ele lembra que é o porto-seguro do filho(a) e isso o relaxa e ele aceita com devoção seu papel coadjuvante no início da vida do filho(a).

O pai joga o filho(a) pro alto, segura-o de ponta cabeça, gira-o no ar e o faz voar como um pássaro ou um avião pela casa, provocando risadas e aventuras. O pai faz cócegas e ensina a dar cambalhota. O pai brinca de pular na cama e no sofá. O pai faz bagunça, molha o banheiro inteiro na hora do banho com as brincadeiras que inventa para divertir o filho(a), agita a criança perto da hora de dormir.

O pai é o grande herói contra os apavorantes insetos. É ele quem a mãe e o filho(a) chamam quando aparece uma aranha, ou uma terrível barata. E o pai triunfa ao socorrê-los e livrá-los da ameaça. O pai alcança nos lugares mais altos e soluciona problemas com sua extrema força. O pai conserta coisas e encontra soluções para todos os tipos de questões cruciais que permeiam o mundo infantil. E quando parece não saber a resposta, ele indica o caminho certo: “pergunta pra tua mãe!”.

O pai é o grande protetor na hora dos perigos. Ele espanta o monstro embaixo da cama e dentro do armário. Ele afasta os medos. Ele mostra que não há nada assustador no escuro. Ele resgata o filho(a) quando cai e se machuca. O pai é porto-seguro, é proteção, é segurança.

O pai é eterno incentivador das conquistas do filho(a). Ele demonstra confiança na capacidade do filho(a) superar os desafios e com isso faz o filho(a) acreditar em si mesmo e no seu potencial, seja para pedalar a bicicleta sem rodinhas, seja para encarar as provas – literais e figuradas – ao longo da vida, ou para ir morar sozinho no exterior.

O pai também é mau. Ele xinga, coloca de castigo, dá palmada. Ele fala muitos “não”. O pai briga com o filho(a), o repreende, fala brabo e ríspido, às vezes com razão, às vezes por pura impaciência, mas sempre imbuído na sincera intenção de fazer o melhor, de educar, ensinar e ajudar a tornar aquele pequeno ser a melhor pessoa desse mundo. Uma pessoa muito melhor do que ele próprio.

O filho(a) cresce e o pai cresce com ele, aprendendo e ensinando quase na mesma medida, pois certamente ele aprende muito mais do que ensina, e enfrenta a rebeldia da adolescência, a indignação sem sentido do filho(a) contra as regras impostas, e o pai se irrita diante da aparente ingratidão do filho(a), e se questiona o que fez de errado, ao mesmo tempo em que sente imenso orgulho de ter criado um filho(a) questionador, independente, com opinião própria.

Nenhuma briga ou discussão é capaz de afastar a admiração que o filho(a) tem pelo pai, e que o pai tem pelo filho(a). Nada é capaz de abalar essa relação que não se formou de forma orgânica, natural, física, e sim por intenção, vontade e muita dedicação.

O filho(a) se torna adulto, se torna pai(mãe), e então aprende a ser filho(a). Compreende os caminhos errantes do pai, seus erros e acertos. Aceita-o com suas qualidades e defeitos, pois agora ele sabe o tanto de esforço que seu pai empenhou nesta relação. O filho(a) agora é capaz de entender os sacrifícios do pai, pois ele agora sente o cansaço das noites mal dormidas, sua própria impotência diante de tantas situações, a incerteza sobre suas atitudes. Ele finalmente percebe que a dor do filho(a) dói muito mais do que a sua própria.

O pai se torna avô e questiona toda a sua trajetória como pai. Ele supõe que poderia ter sido mais brando, que deveria ter aproveitado mais as pequenas coisas, que tantas brigas e discussões poderiam ter sido evitadas, que a disciplina viria com o tempo, mesmo sem tantas reprimendas. E ele se perdoa, pois ele sabe que como avô sua responsabilidade é diferente, pois seu filho(a) irá realizar o papel que um dia foi dele; é de seu filho(a) a triste e necessária responsabilidade de formar um cidadão. A responsabilidade do avô é apenas estar presente.

O filho(a) e o pai se olham e se compreendem através daquela nova criança, das novas posições que ambos assumem, o filho(a) se tornando pai e o pai se tornando avô; e o filho(a) agora sabe com certeza que seu pai é realmente um herói.

 

Uma singela homenagem a todos os pais, especialmente ao pai da minha filha, que divide diariamente esse desafio recompensador comigo, e ao meu pai, que é meu herói, meu espelho e meu porto-seguro.

FELIZ DIA DOS PAIS!

Comentários

  1. Peraí que tem um olho na minha lágrima....
    Certamente um rdo textos que melhor exemplifica o ciclo. Lindo, emocionante!

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  2. Peraí que tem um olho na minha lágrima....
    Belissimo texto! Emocionante

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  3. Amo vocês!!! E obrigada pelo nosso maior presente, a nossa pequenina!
    Gabriel

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  4. Claro que tô chorando... é muito lindo, emocionante. Só tendo muita sensibilidade pra conseguir colocar em palavras esta experiência tão sublime.

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