A ESPERANÇA EM MEIO AO CAOS - P. G. S. ZAGO (TEXTO ORIGINAL)


O que precisamos para viver?

Quanto precisamos consumir?

O que move nossas escolhas?

Qual o motivo da nossa insatisfação?

Por que nos sentimos tão aprisionados pelo confinamento ?

O que a quarentena pode nos ensinar?

Muito. Se estivermos dispostos a aprender.

A razão pela qual nos sentimos tão aprisionados pelo confinamento é porque não estamos meramente confinados em nossas casas, e sim em nós mesmos.

Estamos sendo forçados a conviver com nossa essência, sem rodeios, sem disfarces e sem subterfúgios. Forçados a enxergar nossas expectativas, falhas, defeitos, impotências, ansiedades, medos; tudo o que temos de melhor, e de pior.

Não é a ausência dos outros que nos assombra, mas nossa própria presença e nossa incapacidade de lidar com o caos, sem controle algum sobre o mundo a nossa volta, seja no sentido micro ou macro.

É o fato de termos que admitir para nós mesmos que nunca tivemos controle algum sobre nada, que na maioria das vezes não temos certeza alguma sobre o que estamos fazendo, sobre nossas escolhas e decisões; que muitas vezes sequer sabemos porque nos movemos em certa direção e seguimos nos movendo sem nunca refletir sobre o que nos move.

Não é a energia dos filhos à nossa volta, solicitando atenção quando precisamos nos concentrar em nossas tarefas, do trabalho ou da casa, que nos afeta, mas nossa própria falta de vontade em dedicar nosso tempo, nossa atenção e dedicação àqueles que tanto amamos e dependem de nós.

Não queremos encarar a dura realidade de que muitas vezes preferimos deixá-los na escola, os avós ou na casa de amigos do que sentar no tapete e brincar com eles. Nos entristece não termos criatividade para inventar atividades para preencher seus dias tediosos, longe das praças, parques e amigos, pois muitos de nós nunca se dedicaram, a isso, e a falta de dedicação para quem mais amamos dói. Profundamente.

Não é o fato de o marido - ou esposa - não realizar as tarefas da casa, não cozinhar, não tomar conta dos filhos, que nos importuna. Isso é apenas a parte exposta, superficial. O que nos magoa verdadeiramente é encarar as nossas diferenças, individualidades e egoísmos. É perceber como deixamos de demonstrar nosso amor, admiração e respeito por quem está ao nosso lado por escolha, por opção.

É o fato de que, confinados, forçados a realmente conviver, se torna impossível evitar confrontar situações e constatações das quais há muito nos evadíamos.

Não é a falta de convivência com familiares e amigos que nos provoca tanta solidão, mas a dolorosa percepção do quanto os negligenciamos no dia-a-dia, em nosso cotidiano corrido e cheio de tarefas. É a impossibilidade de negar que muitas vezes deixamos de telefonar, visitar e comparecer a eventos com nossos amigos e familiares, quando esta é a tarefa mais importante a qual deveríamos nos dedicar.

Não é a impossibilidade de ir a shoppings, lojas e mercados e fazer compras para suprir o vazio da alma, muito mais do que o vazio dos armários, mas sim a verdade severa de que consumimos por puro consumismo e a maioria das coisas em que investimos nosso dinheiro são fúteis, superficiais e desnecessárias.

Nos remoem as viagens que não podemos estar fazendo, os lugares do mundo que não podemos visitar neste momento, mas dói muito mais ver o quão mais belos estes lugares estão com nossa ausência, sem o lixo que deixamos para trás, num rastro de destruição, quando passeamos por pontos turísticos, sem a poluição dos nossos carros e das nossas indústrias.

Machuca ver a natureza triunfando enquanto sofremos por conta de um vírus que se espalhou feroz e drasticamente por nossa responsabilidade, por nossas ações, por nossa falta de comprometimento com o mundo, com os outros e com a gente mesmo.

A aceleração dos nossos dias agora deu lugar a uma calmaria com a qual sempre sonhamos e da qual não sabemos desfrutar, e neste tempo que recebemos de presente, e encaramos como uma maldição, é impossível não refletir sobre nosso papel no mundo e nossa contribuição para nosso próprio declínio.

O ideal seria que olhássemos para tudo isso como uma oportunidade de repensar nossas atitudes e mudar radicalmente nossos hábitos; dedicar nossos esforços para o que é realmente importante e para o que, a longo prazo, irá nos fazer sentir orgulho de si mesmo e imensa satisfação, ao que realmente nos traz felicidade diária.

Infelizmente, apesar de tudo que está nos acontecendo, da segunda chance que estamos recebendo, nós que estamos protegidos em nossos lares, saudáveis diante de tanta doença, seguros diante de tanto caos, preferimos manter nossos olhos fechados e reclamar de tudo que nos está sendo tirado ao invés de agradecer por tudo o que nos está sendo dado, e seguir trilhando o mesmo caminho sem volta, sem rumo, sem direção.

O único conforto neste momento é ter esperança na mudança. Esperança na humanidade. Esperança que talvez alguns de nós possam refletir, mudar a si mesmos, mudar o mundo. E que os anos que se sigam tragam melhoras significativas para a humanidade, movidos pelas ações destas pessoas que souberam viver durante a pandemia, e não apenas esperar o tempo passar.

Porque vai passar. 

O tempo, a pandemia, o isolamento. Tudo vai passar. Nós também. O que ficará é a marca que vamos deixar no mundo. O legado que deixaremos para as futuras gerações. E as lições que podemos aprender agora, e o que faremos com elas, podem evitar que outro isolamento seja necessário no futuro. Ou que outro isolamento sequer seja suficiente na próxima vez.

Tudo vai passar. Só não vai passar a esperança de que, unidos, não deixemos haver uma próxima vez.


Comentários

  1. Mamãe, hghdycffsdvbnfxz fghggfffghhjkk gguvvhhhhhh bhhhghhhuhh hggggvg TE AMO, JULIA

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  2. Otima reflexão! Essa momento, faz a humanidade , como especie, refletir sobre sua onipotencia, será que realmente somos tão essenciais ao planeta? Considerando que a natureza se renova lindamente sem nossa interferencia e nos vimos tao frageis diante de um virus, tao impotente diante de sua devastaçao. Temos muito o que evoluir , que essa pandemia realmente nos faça refletir sobre os nossos reais valores e necessitades, e que possamos pensar numa planeta melhor para todos os seres vivos.

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  3. Belo texto, bem verdadeiro. Inspirador para que nos demos conta de exercitar a paciência e promover uma mudança de hábitos, desde já.

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